quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Frenesi

Tu queres que eu aceite o teu drama,
ou que desenhe o chão que tu pisas?
Ofereço-te os olhos rasos e brisas
mas sou volúpia que arde e inflama.

Que doa então a prazerosa mentira
pois não me excita a verdade tão crua,
sou pecado da luxúria à ira
de verdade quero tua entrega, quente e nua.

É tolice ansiar o desprezo
sê fiel ao que realmente fulgura,
é certo que por vezes deslizo
mas eterno é o minuto que dura.

Tu és pedra e eu a água que esculpe
que te banha ainda que tu te endureças,
não esperes que pelo mal me desculpe
pois eu sou tua melhor das sentenças.

Tua mente ao prazer é bloqueio
e não se engane buscando constância,
na dor e comédia é que eu te rodeio
mas se estátua, terás minha distância.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Eupatia

Eupatia
Não quero tua complacência, nem tuas penas, apenas,
não quero olhos rasos, nem quero sua compaixão,
não quero palavras amenas,
me inaugurastes fria e de pés no chão.

Quero o axioma por mais que doa,
quero a expressão simples de quem ignora,
quero teu gesto mesmo que à toa,
mas quero tua verdade agora.

Ainda que a realidade não seja a desejada,
ainda que tua existência me despreze,
melhor que a dúvida velada:
é a certeza que me endurece.

E talvez quem sabe, empedernida então,
eu possa resolver tudo de uma vez:
clarear essa densa escuridão,
e, enfim, me curar do mal que você me fez.

Mas ainda insisto em minha ciropedia,
imagino-te meu, imagino-me tua,
e mesmo que te pareças minha dor uma comédia,
é essa minha instância etérea e nua.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Nocturna

Um pecado se acende no escuro
fulgaz entre os becos discretos
um trago e chama num leve sussurro
e entorpece futuros funestos.

A lua que assiste aos degredos
alumia o corpo dosado em luxúria
sua tez penumbrada em segredos
receosa calmaria ou fúria.

Brindes e drinques à sargeta
errante no êxtase insensato
liberta a sua abjeta faceta
nos desvairos dum orgasmo abstrato.

Sobe o aclive com os saltos na mão
cerrando os olhos à luz da alvorada
derradeiro gole de glória ou perdição
despede-se do dia, fugindo desonrada.

No aguardo da noite que desce
ficaria à espreita da escura redenção
mas o pecado que nasce também padece
e nem o Crepúsculo traz ressurreição.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Noctívaga


Noctívaga

Quando a noite desce lambendo a cidade
criaturas escusas abandonam os abrigos
sombras se instalam sem piedade
e os postes focam no asfalto o perigo

Boca escarlate exibida com altivez
nas mãos carrega o copo cheio
faróis confundem a diminuta lucidez
o torpe e a razão a dividem ao meio

Olhos famintos convidam ao pecado
o corpo a mostra desperta o desejo
quem passou por ela diz ter sido marcado
quem provou seus lábios quer mais que beijo

Tropeços e sustos em muros pulados
labirintos tomados por guarda paralela
desmentem que à noite todos os gatos são pardos
deixam mais insana a busca que não é só dela

Com o salto quebrado em acidentada ladeira
encontra, enfim, nos becos o vício
queria a viagem e não viu fronteiras
sentidos em órbita e depois: suplício

Maculas e lágrimas enquanto o mundo dorme em paz
ela espera a aurora para sua redenção
ao se perceber incólume, ela jura: nunca mais
e ávida espera por mais um crepúsculo de perdição